Coser, entretelar ou enchumaçar ainda são termos comuns na Invicta. Se acha que a alfaiataria já deu o que tinha a dar, continue a ler este artigo. Alexandre Ferreira, Victor Gonçalves e Augusto Saldanha são o exemplo vivo de que a arte ainda vive. A Praça esteve à conversa com estes 3 alfaiates portuenses e descobriu que há mesmo quem não prescinda dos seus serviços.
Alexandre tem 77 anos. |
A Alexandre Alfaiate já faz história na Praça Coronel Pacheco há 80 anos, mas só desde 1962 é que pertence a Alexandre Ferreira. O rapazito que aprendeu a dar os primeiros pontos numa alfaiataria da vila de Mesão Frio aventurou-se com 13 anos na Invicta e acabou por herdar, anos mais tarde e por algumas patacas, o negócio do patrão.
A vida “mudou sempre para melhor” e, hoje, Alexandre, com 77 anos, tem clientes de classe média-alta que já são amigos e que, como não sentem a crise, continuam a bater-lhe à porta.
Com fatos acima dos 900 euros, não é qualquer um que tem um smoking com a etiqueta do Alexandre. “Estou agora a fazer um fato que vai chegar aos 3.500 euros, em pura caxemira. É para uma pessoa muito conceituada cá no Porto”. E o preço nem é assim esticado porque o fato dura muito, mas “o toque é maravilhoso”, explica Alexandre.
“Isto não é como a confecção em que é sempre a mesma coisa e as máquinas é que fazem tudo… é muito difícil”, realça o alfaiate.
E a verdade é que para além do toque ou da forma como “a obra assenta no corpo”, a verdade é que os alfaiates respeitam os tecidos. Não havendo colagem da tela interior, como nas confecções, o fato mantém as condições de ventilação.
Augusto Saldanha é o alfaiate da Rua Trindade Coelho. |
A oficina de Augusto Saldanha esconde-se num primeiro andar aconchegado da Rua Trindade Coelho. Com 60 anos, Saldanha, como é conhecido, é alfaiate há 45.
Aprendeu com o irmão o que tinha para aprender, mas foi no Porto que se tornou artista e se apaixonou pela arte. Dos clientes de classe média-baixa passou para os clientes da média-alta e agora sente-se realizado. “Tenho clientes que vestem o meu fato como uma peça de arte”, conta.
Veste os Pessanha, os Sotto-Mayor, os Portela e outras figuras da cidade, mas o que o deixa verdadeiramente orgulhoso é Paulo Portas, que apelida de “seu manequim”.Saldanha não fala em preços, mas diz que só não sente a crise porque mudou a clientela. “O meu cliente antigo não tem poder de compra. Hoje, um caixa de um banco não pode fazer aqui um fato, não tem possibilidades económicas”.
Para Saldanha, os clientes são amigos que fazem do seu gabinete de provas “um confessionário”, afirma.
A. Gonçalves
Alfaiate há 42 anos, estabeleceu-se na antiga oficina do pai, na Rua Galeria de Paris, e foi ganhando os seus próprios clientes, também oriundos da classe média-alta. Mas Victor Gonçalves não veste amigos. “A relação com os clientes é uma relação profissional. Muitas vezes, roça a amizade, da parte deles para mim”, afirma. E a consideração que eles têm com este alfaiate, é das coisas que mais o orgulha.
Na A. Gonçalves, já lhe pediram de tudo, desde “um vermelho muito vivo” a casacos com os bolsos para trás, com capuz de frade ou com um chapéu de pescador. Os clientes, às vezes, “obrigam a inventar um bocadinho”, o que não seria possível numa confecção artesanal.
Mas qualquer fato, mais estranho ou mais comum, leva a sua marca. “Todos nós podemos fazer a mesma coisa, que nunca será igual. A marca fundamental que fica menos perceptível é o estilo de cada um”.
E Victor é o único dos 3 alfaiates que diz sentir a crise. “Comparando o que fizemos em outras alturas com o momento actual, sim. Os clientes não desapareceram, mas se antes fazia 6 calças por estação, agora faz 3″.
E afinal, que futuro para o alfaiate?
Saldanha acredita que “o alfaiate nunca vai acabar. Acabaram muitos e os bons ficaram” mas Victor já não é tão optimista.
Só há 2 coisas que estes 3 alfaiates têm em comum: têm todos muito trabalho e nenhum deles tem a quem passar o testemunho. Um facto incompreensível, porque a arte parece ser cada vez mais procurada por jovens e, como diz o senhor Saldanha, actualmente, “é o filho que traz o pai”.
Em altura de crise económica, o investimento seria favorável. Fica o conselho, para não deixar morrer a arte – e a oportunidade.
Outras alfaiatarias
- Alfaiataria Santos
- Aires Carneiro Silva
- Rosa&Teixeira SA
- Alfaiataria Queiroga
- Alfaiataria Saldanha Lda
In Porto 24
Por Liliana Pinho
Fotos: Liliana Pinho
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