O ofício de alfaiate surgiu «quase por imposição». Sem colégios
para prosseguir os estudos em Benavila, Alentejo, João Ribeiro escolheu a prática do corte e costura para ganhar a vida. Em Lisboa fez-se mestre e, há 20 anos, estabeleceu-se por conta própria na Alfaiataria Loureiro e Nogueira. Com astúcia e rigor manteve os clientes que trouxe do local onde anteriormente trabalhava e soube renovar a clientela. Aos 62 anos lamenta que a profissão em Portugal não seja tão reconhecida como outrora.
Na rua há o burburinho de quem aguarda vez para entrar num dos elevadores mais emblemáticos de Lisboa. O elevador de Santa Justa foi desenhado pelo engenheiro português Raoul Mesnier du Ponsard. O ascensor que liga a Baixa pombalina ao Bairro Alto funciona desde 1902 e atrai todos os dias milhares de turistas
No número 79, 1º andar, da rua com o mesmo nome do elevador, indiferente ao burburinho da cidade, João Ribeiro exerce profissão antiga: é alfaiate. De origem alentejana, conta que «na terra, Benavila, concelho de Avis, não havia colégios, nada para estudar. Tinha pois de escolher uma profissão. Foi quase por imposição porque não havia muito por onde escolher». Foi assim que ainda em Avis, João Ribeiro começou a dar os primeiros passos no ofício de «cortar e coser. Hoje gosto muito do que faço», sublinha.
Os alfaiates eram tidos em grande consideração. A profissão era exigente e, por isso, reconhecida pela sociedade. Com instrumentos simples, tesoura, régua, giz, exigia-se, contudo, ao alfaiate que tivesse bons conhecimentos de geometria e aritmética.
João Ribeiro gosta de adicionar um pouco de «sorte» a estes factores. Na Alfaiataria Loureiro e Nogueira, que gere desde 1992, comenta, espreitando por cima dos óculos, suportados na ponta do nariz: «Quando vim para Lisboa, estive em algumas casas. Aquela onde estive mais tempo, 29 anos, foi na Alfaiataria David, na Rua de São Nicolau. O senhor David era judeu e homem com muita visão para o negócio. Foi aí que aprendi praticamente tudo. Tive sorte».
«O senhor David tinha visão de negócio. Antes mesmo do pronto-a-vestir existir em todo o lado, ele já tinha algumas peças à venda, como camisas, pólos, gravatas. Estava preparado para este avanço. Era um visionário. E isto foi o que sustentou a alfaiataria. As encomendas de roupa por medida diminuíram. Eu estive na Alfaiataria David até ela praticamente fechar portas. Saí e pouco tempo depois aquilo encerrou, já o senhor David havia falecido há alguns anos», explica João Ribeiro.
A Alfaiataria Loureiro e Nogueira foi fundada em 1930, as quotas
do espaço foram cedidas a vários alfaiates e, em 1992, chegaram
às mãos do alentejano João Ribeiro. O espaço pequeno mantém-se igual. Uma pequena sala, com um cabide para pendurar chapéus e sobretudos, acolhe o cliente após subir as escadas de madeira votadas, quase, ao abandono. O prédio há muito que vê os habitantes partirem para outras casas, mais modernas, e afastadas do centro histórico da cidade.
O chão e os móveis são de madeira. Contrastam com as paredes brancas. Uma habitação pequena alberga a mesa para marcar roupa, e manequins vestidos com casacos, calças, sobretudos. Peças de roupa feitas com preceito e por medida que aguardam os donos.
«Tenho clientes que fazem 10, 12 fatos por ano. Há pessoas que têm mania da roupa. Fazem porque gostam. Os tecidos vêm sobretudo de Itália e Inglaterra, a indústria cá desapareceu e o que há não tem muita qualidade, mau acabamento», diz o alfaiate.
Alguns tecidos estão expostos numa prateleira logo que entramos no atelier Loureiro e Nogueira. No centro da sala, está a mesa para desenhar. Com o giz, João Ribeiro faz uns rabiscos num casaco que, para um leigo no ofício, parece estar concluído».
Alguns tecidos estão expostos numa prateleira logo que entramos no atelier Loureiro e Nogueira. No centro da sala, está a mesa para desenhar. Com o giz, João Ribeiro faz uns rabiscos num casaco que, para um leigo no ofício, parece estar concluído».
O alfaiate apressa-se a explicar: «O cliente veio há pouco provar o casaco. Estava já concluído. Mas ele quer que fique um pouco mais cintado. É isso que estou a fazer. Faço o desenho do que deve ser retirado e dou às costureiras para elas retirarem o excesso».
Entre os clientes gosta de referir, Mário Soares, o político. «Vestiu-o durante toda a sua presidência», comenta. Mas na carteira de fregueses, há outro, mais anónimo, que João Ribeiro gosta sempre de citar, ainda que sem nomes.
Sara Pelicano
«O senhor Teixeira, o alfaiate que aqui estava queria reformar-se e propôs-me que eu comprasse as quotas. Mas eu não tinha dinheiro e a banca não emprestava como hoje. Então pedi emprestado a um cliente meu na casa David. Sai então desta alfaiataria e, claro, trouxe a clientela atrás. Há 20 anos quando me estabeleci aqui, eu tinha a clientela toda na mão. As pessoas vão atrás do profissional. E foi assim que me estabeleci por conta própria».
Num ofício em vias de extinção, João Ribeiro conta como renovou a carteira de clientes. «Os clientes eram todos velhotes e percebi que tinha de renovar a clientela. Foi então que fiz facilidade de pagamento. A única vez que isso aconteceu na minha casa. Aos jovens que estavam a iniciar a carreira, permiti-lhes que pagassem em duas ou três vezes. Hoje estão todos bem empregados e pagam a pronto. Mas assim consegui rejuvenescer os meus clientes», afirma.
Aos 62 anos, João Ribeiro confessa ter disposição para trabalhar mais alguns anos e conclui que «gostava de ter quem lhe seguisse os passos. Poucos são os que procuram a actividade e os que querem seguir o ofício vão para fora onde o ofício é mais reconhecido».
Aos 62 anos, João Ribeiro confessa ter disposição para trabalhar mais alguns anos e conclui que «gostava de ter quem lhe seguisse os passos. Poucos são os que procuram a actividade e os que querem seguir o ofício vão para fora onde o ofício é mais reconhecido».
Boa noite!
ResponderEliminarO meu nome é Bernardo, e tenho 18 anos. À algum tempo que descobri o seu blog, e adorei. Sou estudante de Design de moda (a acabar o curso). Apesar de gostar muito de desenhar, tambem tenho uma enorme paixao pela modelagem, o corte e a costura. Apesar de ser novinho, gosto de todas as técnicas ancestrais da arte da confecçao, como a alfaiataria (que tem muito que se lhe diga) e da alta-costura, técnicas que são do melhor que há.
Gosto de todos os artigos que posta, quer por estarem bem redigidos, de forma clara, quer pelo conteudo, que mostra alguns dos profissionais desta arte.
Gostaria, quem sabe, de aprender com algum destes mestres que apresenta no seu blogue, que certamente me iriam ensinar muito, e aprenderia com todo o gosto :D
Continue com o excelente trabalho que tem feito :D.
Abraços, Bernardo.
Olá Bernardo. eu dou cursos de formaçao para alfaiataria, se realmente quer aprender esta arte, tem de procurar ou alfaiates que o possam ensinar, ou tera de se inscrever num dos cursos que dou na modatex em benfica, se pretender mais informações deixo-lhe o meu email. de forma me contactar, j.t.faria@hotmail.com
ResponderEliminarum abraço
ass.
josé A.Faria