sábado, 24 de maio de 2008

Alfaiates ameaçados de extinção

Arte pode desaparecer em Portugal dentro de duas décadas

Amanhã, realiza-se, em Belmonte, o 19.° Encontro Na­cional de Mestres Alfaiates. A ini­ciativa leva vida longa, mas pode não dobrar o número de edições: dentro de 20 anos, a arte pode de­saparecer.
O organizador, Carlos Godinho, autorizado por 46 anos de viagens pelo país no seu comércio de teci­dos, estima abaixo dos dois mil o número de profissionais e nulo o de aprendizes. "Os alfaiates mais novos devem ter uns 40 anos de idade e se houver 20 ou 30 nessa faixa é muito. Por isso, eu digo: daqui a uns 20 anos já não há al­faiates em Portugal".
Pode restar uma minoria, pois "talvez 40% consigam fazer algu­ma coisa para clientes abastados", obra com preços a partir dos 750 euros. Mas o resto "tem pouco que fazer", explicou, citado pela agên­cia Lusa. "Trabalha para a classe média, que não já tem dinheiro para ir ao alfaiate, nem para fazer um dos fatos mais baratos" - a par­tir de 120 euros.
Lá vai o tempo em que "toda a gente tinha o seu fatinho". O mer­cado ditou a extinção dos mestres alfaiates, é certo, mas o Estado não ajuda, critica. "Nunca se cria­ram escolas para ensinar a arte, nunca se criou um estatuto para o alfaiate, deixaram os alfaiates so­brecarregados de impostos e sem incentivos à profissão", enuncia, propondo a eliminação do IVA so­bre a mão-de-obra e incentivos ao emprego de aprendizes, cujos primeiros três ou quatro anos de aprendizagem "nada rendem".
"Daqui a uns anos, temos que fazer o mesmo que os Estados Unidos, que levaram italianos, gregos e portugueses para lá, por­que ficaram sem alfaiates. Co­nheci alguns, da Guarda, que não hesitarem, porque tinham viagem e casa pagas", conta. "Se me perguntarem se ainda há razões para haver alfaiates, eu pergunto se ainda há razões para um homem querer andar elegan­te, bem vestido, com um fato a cair bem", observa. Ou então quem não encontra tamanho que lhe sirva no pronto-a-vestir. "Os al­faiates transformam um corpo mal feito numa obra de arte", ga­rante.
O Encontro Nacional de Mes­tres Alfaiates realiza-se no últi­mo domingo de Maio, dia do pa­droeiro, "o Santo Homem Bom, de Itália, uma tradição que foi trazi­da para Portugal". A edição deste ano tem 60 inscritos - poucos "porque o negócio está fraco e os combustíveis subiram muito" -mas promete animar Belmonte com visitas ao património local e um almoço-convívio.


Nuno Alegria
In JN
23/05/2008

Sem comentários: