Ao longo de quase 50 anos de actividade, a Alfaiataria Gaspar vestiu algumas das figuras mais conhecidas desta cidade, numa época em que a roupa era feita por medida e ter um fato era sinónimo de posição social ou de festejo importante. Os anos passaram e a evolução social deu lugar ao pronto-a-vestir, fazendo com que alfaiates e costureiras fossem caindo em desuso.
No entanto, na rua do Almocreves, em pleno centro histórico de Setúbal, no primeiro andar do n.º 8, Vítor Gaspar transformou o espaço numa galeria onde expõe as suas pinturas, para além de vários objectos e documentos que foi guardando ao longo dos muitos anos em que exerceu a profissão de alfaiate.
Subidos ao primeiro andar daquele espaço, somos “recebidos” por uma máquina de costura “Singer” onde se encontram expostos artigos indissociáveis desta profissão, tais como a almofada de alfinetes, a tesoura de corte, o giz e outros tantos que faziam parte do dia-a-dia de um alfaiate. Sobre uma mesa de trabalho, um corte de bombazine, bem esticado e já devidamente marcado pelas mãos do mestre, mostra a primeira fase do que iria ser um par de calças de homem, certamente para o aconchego de mais um Inverno. A um canto da área de trabalho, os apontamentos mais preciosos de um alfaiate: as medidas de cada um dos clientes, devidamente identificadas e minuciosamente apontadas para que, ao envergar o fato, o mesmo caísse no corpo de quem o encomendou como uma segunda pele.
Mesmo ali ao lado, um expositor mostra as melhores fazendas e as escolhas a fazer pelo freguês que só tem que imaginar como irá ficar vestido nos vários tons que a casa oferece.
Junto ao varandim da habitação, numa outra mesa estão recordações de uma vida: a sebenta de um curso de 10 meses, tirado em Lisboa em 1955, que final era avaliado por mestres alfaiates, que definiam o resultado, individual, de cada um dos futuros profissionais; fotos diversas, entre elas a presença de Vítor Gaspar em Congressos de Mestres Alfaiates realizados um pouco por todo o mundo; uma outra foto já com o mestre na sua loja – então situada no n.º 10 da referida rua -, tendo por detrás um dos fatos oficiais que, feitos naquela alfaiataria, foram usados pela comitiva do Vitória de Setúbal na sua digressão pelos Estados Unidos, entre muitas outras peças que compõem esta exposição de uma profissão que os mais novos, certamente, pouco terão ouvido falar e muitos nem saberão que alguma vez tenha existido.
No entanto, esta mostra completa-se com uma outra exposição que preenche as paredes deste atelier/galeria, constituída por quadros, a óleo sobre tela, da autoria de Vítor Gaspar e que o mesmo intitulou de “O alfaiate através dos tempos” e que, tal como a designação indica, mostra a arte da alfaiataria aos longos dos séculos.
Aliás, esta exposição pretende, segundo Vítor Gaspar, dar a conhecer “principalmente aos mais novos, uma profissão quase extinta e que muitos nem saberão o que era, como se fazia e quais as fases por que passava a confecção de uma peça de roupa”. Questionado sobre a extinção desta arte, Vítor Gaspar diz que a mesma “era previsível. Os tempos mudaram e as pessoas já não têm tempo, nem paciência, para estarem vários dias a espera de uma peça de roupa, que ainda tinha que passar por provas antes de estar concluída”. Por outro lado, o ex-alfaiate diz que actualmente “existem no nosso pais bons estilistas, que apresentam trabalho de grande qualidade e que não tenho dúvidas que poderão ter muito sucesso a nível internacional”.
A exposição sobre esta profissão está, tal como já referimos, patente no 1.º andar do n.º 8 da rua dos Almocreves e quem a pretenda visitar, nomeadamente, grupos escolares, poderá fazê-lo a partir de marcação através do número 933151662.
Ana Maria Santos
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