sexta-feira, 22 de maio de 2009

Vida dedicada às capas de burel


Aos 72 anos, Aureliano Ri­beiro é o último de uma geração de alfaiates que ao longo de algumas cen­tenas de anos confeccio­naram a "sui generis" capa de honras mirandesa, uma das mais nobres peças do traje popular português. Ao longo dos mais de 60 anos em que se senta em fren­te à sua velha máquina de costura "Singer", o artesão já perdeu a conta ao número de capas que costurou. Recorda que a arte foi herdada do seu pai e do seu avô, mantendo-se fiel ao "estilo" con­cebido ao longo de mais de três gerações, "Agora já se fazem poucas ca­pas", lamenta. No entanto, "conti­nuam a ser muito apreciadas, não só por autóctones, mas também por quem vem de fora " refere Au­reliano Ribeiro. O artesão garan­te que a procura da capa de hon­ras mirandesa se deve "à riqueza e beleza desta peça única do traje português".
A capa é uma peça de grande valor etnográfico feita de pura lã de ovelha (burel) e requer um trabalho minucioso por parte de quem a confecciona, devido à sua complexidade. Uma capa de honras pode demorar mais de duas semanas a cortar, decorar e costurar.
Se no passado esta capa de ori­gem "medieval" serviu para pro­teger os pastores da região do Pla­nalto Mirandês da agressividade do clima, actualmente é uma peça apenas utilizada em cerimónias protocolares ou outros actos de importância relevante, sendo usual oferecer uma destas vestes a figuras distintas que visitam o município de Miranda do Douro.
Apesar do valor desta peça de vestuário, o artesão não esconde a mágoa de não ter seguidores masculinos na arte, já que só algu­mas costureiras na região confec­cionam as capas de honras. "Ain­da tentei fazer alguns cursos de aprendizagem, mas não há quem queira saber desta arte", garante Aureliano. Seguro de si, o artesão afiança que a confecção de uma capa é dos serviços mais duros de um al­faiate, devido ao peso das peças de burel e à força empregue du­rante a sua concretização. "No passado as capas de honras eram feitas só por alfaiates. É um servi­ço pesado. Actualmente só faço capas por encomenda. Longe vão os tempos em que se faziam cer­ca de 50 por ano", lembra o arte­são.
Na parede do seu pequeno e rústico ateliê é possível observar vários diplomas, sendo o mais importante o primeiro prémio do Concurso Nacional de Artesana­to, atribuído em 1992, a uma capa de honras desenhada e costura­da por este homem de Constantim, no concelho de Miranda do Douro.


FRANCISCO PINTO
braga @jn.pt

In Jornal de Notícias

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