Fernando Gonçalves Alfaiate, a experiência na hora do corte
No entanto, com o desenvolvimento desenfreado do pronto-a-vestir, em todo o mundo, nos últimos anos o papel do alfaiate foi perdendo força progressivamente e o número de encomendas foi diminuindo. Hoje há, no entanto, quem lamente o desaparecimento progressivo desta tão bela arte. Os «artistas antigos» vão trabalhando a conta gotas, com a certeza de que já não encontram aprendizes a quem ensinar o ofício. Enquanto existirem, no entanto, os alfaiates vão tentando manter viva esta arte antiga e procurando estar no mercado através da diferença e da qualidade.
Com dez anos apenas, Fernando Gonçalves começava a tomar gosto pela arte do corte e da costura, acompanhava a mãe, costureira, "de mão cheia", diz, quando ia para o trabalho e não mais deixou de querer aprender a arte. Trabalhou em outras actividades, mas cedo percebeu que o seu futuro passava pela alfaiataria.
Em 1971 tirou o Diploma de Contra Mestre, na Academia de Corte para Alfaiate, "por correspondência", lembra com saudade. Estabeleceu-se, bem no centro da cidade do Porto, onde permanece até hoje.
Com muitos anos de experiência no sector vai mantendo a sua actividade viva, resistindo ao sabor dos tempos e ao desaparecimento dos colegas de profissão e de clientes antigos e fies. Conhece como ninguém a arte do corte por medida. Vestiu ao longo da vida, "muitos senhores. Alguns de extrema elegância, que procuravam sempre bons fatos, alguns para cerimónias especiais", lembra. "Há 30 anos quem queria um fato tinha mesmo que recorrer ao alfaiate e o conceito de bem vestir era outro". Hoje a realidade é diferente. Os mercados abriram-se e foram «invadidos» pela proliferação das confecções, que contribuíram de forma significativa para retirar mercado aos artistas do corte. As encomendas foram diminuindo e o hábito de recorrer ao alfaiate foi desaparecendo com o surgimento de novos hábitos de vestuário e de novas gerações. Fernando Gonçalves diz que para isso também contribuiu "o desaparecimento do fato dos guarda-roupas dos portugueses. A juventude já não dá valor ao fato bem confeccionado", lamenta, "o dinheiro nos bolsos também vai escasseando e o fato pronto acaba por se revelar a solução mais acessível".
De uma marca boa ou má, Fernando Gonçalves consegue, no entanto, distinguir na perfeição e só de olhar, o fato que sai do pronto-a-vestir, e o que é confeccionado pelas mãos de um artista. "Os acabamentos e os cortes são completamente diferentes", diz. Uma manga mais comprida, um repuxe nas ombreiras, uma costura mal feita são pormenores que não escapam aos olhos deste especialista e "que fazem a diferença na arte de bem vestir um fato", realça. "Um fato à medida é sempre um fato à medida. Feito para o nosso corpo e adaptado às nossas características físicas". Apesar das dificuldades do negócio e da diminuição das encomendas, Fernando Gonçalves vai trabalhando, .todos os dias, com a mesma força e a mesma destreza de outros tempos. Imprime o mesmo rigor e a mesma qualidade no momento do corte e da costura. Acompanha de perto as tendências da moda internacional e tem para oferecer aos seus clientes os melhores tecidos, das melhores marcas. Inglesas, italianas e algumas portuguesas, com uma variedade de oferta alargada, na procura de satisfazer sempre todo o tipo de cliente. Do mais modesto ao mais exigente.
In Primeiro de Janeiro
2 comentários:
Não posso deixar de exprimir o meu descontentamento por não ter conhecido este mestre de "mão".
Sei no entanto que deixou discípulos...E portanto partilhou o seu conhecimento.
Nos dias que correm de facto, os investimentos têm que ser cada vez mais ponderados, devido à perda do poder de compra das pessoas.
No entanto não posso deixar de partilhar, que a decisão de compra está na emoção que desperta em nós o bem adquirido.
Faço parte do grosso da população que perdeu esse poder de comprar, mas ainda assim, gosto de fazer os meus poucos investimentos de forma certeira e acima de tudo que me provoquem emoções fortes cada vez que deles usufruo.
Num futuro próximo, espero poder atestar as emoções fortes geradas pela criatividade da nova geração de alfaiataria, que alia as novas tendências e não descura o rigor e a qualidade transmitida pelos grandes mestres de outrora.
Carlos Rodrigues
Eng. Mecânico
Lamentavelmente não posso colocar este comentário na primeira página. Tenho que o colocar no artigo que lhe deu origem. Mas gostaria de deixar um agradecimento especial ao autor destas palavras, em nome de todos os alfaiates, pela homenagem ao grande mestre alfaiate, Senhor Fernando Gonçalves.
Alfaias
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