quinta-feira, 30 de outubro de 2008

CARINHOS PARA A SUA CAMISA

Na década de 1950, as camisas eram engomadas para permitir que se usassem mais tempo. Desde o aparecimento da máquina de lavar, as camisas podiam ser lavadas diariamente e não havia necessidade de as engomar. Era frequentemente aconselhado que se pusesse a camisa numa capa de almofada ou se virasse do avesso antes de ser lavada, para que se protegesse o tecido, mas nem esse ritual é agora necessário. Uma camisa de qualidade pode – sem tratamento especial – ser lavada semanalmente por cinco ou sei anos antes que as primeiras marcas de uso sejam visíveis. No entanto, é sempre importante respeitar as instruções de lavagem.

É preferível remover a camisa do estendal ainda húmida para que se consiga passar a ferro mais facilmente. Porém, se estiver muito seca, deve humedecê-la com um spray e deixá-la num saco plástico durante 30 minutos.

Comece por passar a ferro as mangas, é sempre melhor fazê-lo numa mesa própria para mangas. Passe desde o centro da manga, termine nos punhos. Depois, ponha as costas da camisa na mesa de passar, com o interior virado para cima e passe, tenha atenção às dobras. Repita no outro lado. Passe para o colarinho, começando pelas pontas em direcção ao meio para evitar rugas. Vire o colarinho ao contrário e passe de novo, inserindo depois as clavículas. Último passo – passar os dois painéis frontais, cuidado com os botões. Camisas passadas a ferro ficam melhor penduradas em cabides.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Exemplo de uma antiga agremiação dos mestres

No Porto, os tanoeiros tinham Santo António como padroeiro; Santa Ana presidia à confraria dos botoeiros; os pedreiros reuniam-se sob a protecção de Santa Luzia; S. José e S. Brás eram os patronos dos carpintei­ros. Os alfaiates tinham a sede da sua agremiação na capela de Nossa Senhora de Agosto, que até aos idos de quarenta esteve em frente à entrada prin­cipal da Sé, onde funcionava sob a protecção daquela imagem e de São Bom Homem. A capela, por albergar a sede da referida corporação, era popularmente conhecida por Capela dos Alfaiates. As corporações profissionais constituíam-se em confrarias sempre sob o patrocí­nio de um santo e com sede numa capela. A Confraria dos Alfaiates foi das mais importan­tes e influentes na cidade. No curto espaço de uma crónica não é possível abordar toda a sua rica e longa história. Convi­dam-se, no entanto, os leitores interessados por estas minudências a consultar os estatutos da corporação existentes, por exemplo, na nossa Biblioteca Pública Municipal. A leitura desse documento permite a quem o consultar ficar a saber mais sobre a origem da confra­ria, sua organização e fins, elementos directivos e adminis­trativos, suas funções, encargos e obrigações para com os aprendizes e benefícios para os membros da Confraria que caíam doentes ou ficavam impossibilitados de trabalhar.

In "À Descoberta do Porto"

Germano Silva

JN 24-08-2008


sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Opinião


ALFAIATES
Por José Andrade

Não vou aqui falar numa freguesia do concelho do Sabugal nem de uma graciosa ave migradora com um bico esquisito, tipo sovela de sapateiro, mas sim de uma profissão que, segundo li há pouco tempo num jornal, se extinguirá dentro de vinte anos, o que eu acho optimismo exagerado. Com efeito, a arte de alfaiate, muito popular em Condeixa há meio século, está praticamente extinta. Haveria para aí, dentro da vila, cerca de uma vintena de indivíduos exercendo essa arte, já com a categoria de mestre. Aprendizes, semioficiais e oficiais - era esta a hierarquia dentro da profissão – talvez houvesse para aí o dobro dos que já se tinham alcandorado ao topo da arte. Era mestre quem sabia tomar medidas e talhar.
Hoje, o único sobrevivente de uma arte que aqui foi muito florescente, está com oitenta anos mas ainda mantém intacta a sua oficina . Embora já não se aventurando a manufacturar obra de responsabilidade ainda constitui um “pronto-socorro” para quem precise de apertar ou alargar um casaco ou umas calças, subir ou descer bainhas ou mangas e se for “bem conversado” ainda confecciona um bom par de calças para ambos os sexos. É o Joaquim Barrico, toda a vida mais conhecido pelo Quim Manoco que desde muito novo foi um alfaiate de sucesso. Desejo a este Amigo mais uns anitos com boa qualidade de vida.
Até aos anos cinquenta, era rara a peça de vestuário que não fosse feita por medida. Quando um fato era adquirido nalguma loja de pronto a vestir, o que acontecia quase somente nas cidades, qualquer alfaiate comentava desdenhosamente que se tratava de “obra de fancaria” isto é vendida por fanqueiros (estou a lembrar-me de uma rua da nossa capital, com este nome).
O freguês entregava o tecido na alfaiataria, submetendo-se desde logo a tomada de medidas pelo mestre alfaiate cuja fita métrica estava ordinariamente suspensa sobre o seu pescoço A fazenda era molhada para posteriormente não encolher. A obra iniciava-se com o esboço do fato feito com giz próprio, seguindo-se o corte e depois todas as operações de confecção que incluía uma ou duas provas. Um terno (casaco, colete e calças) exigia trabalho mais aprimorado e era feito geralmente de tecido de qualidade que só os mais abastados tinham possibilidades de adquirir. Para os de menos posses havia o cotim, a ganga e a saragoça que não exigiam confecção muito apurada, dispensava forros e por isso era menos onerosa.
Recordo-me da intensa azáfama que reinava nas alfaiatarias de Condeixa nas semanas que precediam as épocas festivas, designadamente a Páscoa o Natal e também o dia da procissão do Senhor dos Passos.
O Domingo de Páscoa e o 25 de Dezembro eram, principalmente, os dias em que muitos desejavam estrear fatiota nova e então, o trabalho nas oficinas de alfaiate desenrolava-se com frenesim fora do comum nas vésperas de tão importantes celebrações. Não havia horários e os serões prolongavam-se até às tantas. Também não havia folgas e era apertado o tempo dispensado às refeições e ao descanso. Cortar, (talhar) alinhavar, coser à máquina e à mão, provar, casear, pregar botões e passar a ferro eram operações que se sucediam com celeridade mas quase sempre sem prejuízo do apuramento da obra pois também estava em jogo o prestígio dos artífices, não estando também excluída uma natural rivalidade entre essa classe de artesãos . Os janotas queriam exibir-se, e os alfaiates, na mira de proventos que os compensassem de épocas mais brandas, davam o máximo.
Alguns alfaiates da minha terra tinham a sua freguesia disseminada nos meios ferroviários mais próximos – Granja do Ulmeiro, Santo Varão, Formoselha e Pereira do Campo. Nas suas oficinas predominava o tecido de cor castanha , tonalidade usada para os fardamentos dos funcionários da CP, designadamente factores e revisores. Ao Domingo, lá iam eles montados nas suas bicicletas com a trouxa dos fatos muito bem acondicionada na “bagageira” do velocípede, afrontando por vezes resignada e estoicamente a chuva impertinente ou a impiedosa canícula. Antes de terem bicicleta, alguns aproveitavam a boleia de moleiros que faziam o seu carreto para aquelas bandas. Regressavam já de noite, depois de terem percorrido mais de três dezenas de quilómetros muitas vezes com os bolsos sem a quentura do dinheirinho por que tanto almejavam e que só era mais certo nos dias de pagamento dos servidores daquela empresa ferroviária. Partilhei intensamente, até à altura de ir para Coimbra tirar o meu modesto curso comercial, esta atribulada vida de alfaiate. Meu Pai era um deles e levou sempre, como tantos outros, uma vida de sacrifício pois nesta terra, tirando um ou dois alfaiates bem afreguesados, todos os demais estavam longe de viver desafogadamente.
Os alfaiates estão pois, em vias de extinção irreversível. As lojas de “pronto a vestir”, ultimamente com forte concorrência dos ciganos nas feiras, foi gradualmente acabando com eles. Nas grandes cidades ainda vão subsistindo os melhores, que são procurados por executivos ou gente da alta que embora pagando caro, ainda preferem um fato que se molde bem ao seu corpo ou então que, pela sua corpulência ou defeito físico, não encontrem naqueles estabelecimentos coisa que lhes assente bem. Mas a verdade é que a confecção de obra personalizada está a passar à história.

26.06.08

CW: Zilda Monteiro

In "O Despertar"

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Alfaiates são vestígios de um Porto que teima em existir



O Porto ainda mantém vários sinais de um passado em que fatos eram coisa só de alfaiate. Com a chegada dos prontos-a-vestir, o número de encomendas começou a decrescer. José Oliveira, 1º secretário da Confraria dos Alfaiates, acredita que o ofício está perto da extinção, mas há quem não tenha mãos a medir para satisfazer os clientes, hoje em dia quase todos oriundos das classes mais altas.


Amanda Ribeiro
Imagem: Duarte Ferreira
In JPN
http://jpn.icicom.up.pt/

terça-feira, 24 de junho de 2008

Cavaco Silva distingue melhor alfaiate

Gualdino Pimenta alfaiate

Albergaria-a-Velha

O Presidente da República, Ca­vaco Silva vai condecorar ama­nhã Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, Gualdino Pimenta, alfaiate há mais de 50 anos que apresenta uma defi­ciência motora com grau de in­capacidade de 80 por cento, com a Medalha da Ordem de Mérito. Com 61 anos de idade, Gualdino Pimenta foi considerado em 2004 o melhor alfaiate do mun­do, tendo recebido em Paris (França) o prémio de Ouro pela Qualidade. No ano passado foi galardoado em Frankfurt (Ale­manha) com outro prémio.»

In JN

sábado, 24 de maio de 2008

Alfaiates ameaçados de extinção

Arte pode desaparecer em Portugal dentro de duas décadas

Amanhã, realiza-se, em Belmonte, o 19.° Encontro Na­cional de Mestres Alfaiates. A ini­ciativa leva vida longa, mas pode não dobrar o número de edições: dentro de 20 anos, a arte pode de­saparecer.
O organizador, Carlos Godinho, autorizado por 46 anos de viagens pelo país no seu comércio de teci­dos, estima abaixo dos dois mil o número de profissionais e nulo o de aprendizes. "Os alfaiates mais novos devem ter uns 40 anos de idade e se houver 20 ou 30 nessa faixa é muito. Por isso, eu digo: daqui a uns 20 anos já não há al­faiates em Portugal".
Pode restar uma minoria, pois "talvez 40% consigam fazer algu­ma coisa para clientes abastados", obra com preços a partir dos 750 euros. Mas o resto "tem pouco que fazer", explicou, citado pela agên­cia Lusa. "Trabalha para a classe média, que não já tem dinheiro para ir ao alfaiate, nem para fazer um dos fatos mais baratos" - a par­tir de 120 euros.
Lá vai o tempo em que "toda a gente tinha o seu fatinho". O mer­cado ditou a extinção dos mestres alfaiates, é certo, mas o Estado não ajuda, critica. "Nunca se cria­ram escolas para ensinar a arte, nunca se criou um estatuto para o alfaiate, deixaram os alfaiates so­brecarregados de impostos e sem incentivos à profissão", enuncia, propondo a eliminação do IVA so­bre a mão-de-obra e incentivos ao emprego de aprendizes, cujos primeiros três ou quatro anos de aprendizagem "nada rendem".
"Daqui a uns anos, temos que fazer o mesmo que os Estados Unidos, que levaram italianos, gregos e portugueses para lá, por­que ficaram sem alfaiates. Co­nheci alguns, da Guarda, que não hesitarem, porque tinham viagem e casa pagas", conta. "Se me perguntarem se ainda há razões para haver alfaiates, eu pergunto se ainda há razões para um homem querer andar elegan­te, bem vestido, com um fato a cair bem", observa. Ou então quem não encontra tamanho que lhe sirva no pronto-a-vestir. "Os al­faiates transformam um corpo mal feito numa obra de arte", ga­rante.
O Encontro Nacional de Mes­tres Alfaiates realiza-se no últi­mo domingo de Maio, dia do pa­droeiro, "o Santo Homem Bom, de Itália, uma tradição que foi trazi­da para Portugal". A edição deste ano tem 60 inscritos - poucos "porque o negócio está fraco e os combustíveis subiram muito" -mas promete animar Belmonte com visitas ao património local e um almoço-convívio.


Nuno Alegria
In JN
23/05/2008

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Humor

DOR DE CABEÇA...

Um tipo que sofria de uma dor de cabeça crônica infernal foi ao médico que,
depois dos exames da praxe, lhe disse:
- 'Meu caro, tenho uma boa e outra má notícia. A boa, é que posso
curá-lo dessa dor de cabeça para sempre. A má notícia é que para fazer isso eu
preciso castrá-lo! Os seus testículos estão pressionando a espinha, e
essa pressão provoca uma dor de cabeça infernal.
Para aliviar o sofrimento, preciso removê-los'.
O tipo levou um choque, e caiu em depressão. Passou dias meditando.
Indagava se havia alguma coisa pela qual valesse a pena viver.
Não teve outra escolha a não ser submeter-se à vontade do bisturi. Quando
deixou o hospital, pela primeira vez, depois de 20 anos, não sentia dor de
cabeça. No entanto, percebeu que uma parte importante de seu corpo estava faltando.
Enquanto caminhava pelas ruas notou que era um homem diferente,
e que poderia ter um novo começo. Avistou uma loja de roupas masculinas de classe e ...
- 'É disto que eu preciso', disse para si mesmo.
- 'Quero um fato novo', pediu ao vendedor. O vendedor, alfaiate de idade avançada,
deu uma olhadela, e falou: - 'Vejamos... é um 44 longo'.

O tipo riu: - 'É isso mesmo, como é que o senhor soube?'
- 'Estou no ramo há mais de 60 anos', respondeu o alfaiate.
Experimentou o fato, que lhe caiu muito bem.
Enquanto se admirava no espelho, o alfaiate perguntou: - 'Que tal uma camisa nova?'
Ele pensou por alguns instantes: -'Claro'.
O alfaiate olhou e disse: - '34 de manga, e 16 de pescoço' .
E ele pasmado: - 'Mas, é isso mesmo, como pôde adivinhar?'
-'Estou no ramo há mais de sessenta anos', disse. Experimentou a
camisa e ficou satisfeito.
Enquanto andava pela loja, o alfaiate sugeriu-lhe: - 'Que tal uma cueca nova?'
- 'Claro'.
O alfaiate olhou seus quadris, e disse: - 'Vejamos... Acho que é 36'.
O gajo soltou uma gargalhada.
- 'Desta vez, enganou-se. Uso o tamanho 34 desde os 18 anos de idade'.
O alfaiate sacudiu a cabeça: - 'Você não deve usar 34.
O tamanho 34 pressiona-lhe os testículos contra a espinha, e essa pressão vai
provocar-lhe uma dor de cabeça infernal.'

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Alfaiataria centenária em Guimarães vai fechar portas

Fernando Fernandes não tem quem queira dar continuidade ao negócio


Foto: Arquivo JN

Ao fim de 68 anos, uma vida, Fer­nando Fernandes está resignado: a alfaiataria que o pai fundou, há 100 anos, vai mesmo ter de fechar por­tas. Não há quem queira dar continuidade ao negócio. Os filhos enve­redaram por outros ofícios, que isto de seguir as pisadas dos pais já foi chão que deu uvas; e aprendi­zes….não existem. "A arte está a morrer. É a ordem natural das coi­sas. Tal como desapareceram os cocheiros, os merceeiros, os alfaia­tes à moda antiga são cada vez me­nos", diz o mestre da tesoura. Fer­nando Fernandes começou aos 12 anos, a "coser trapos" aos pés do pai, numa altura em que pela alfaiataria passavam dezenas de apren­dizes e a palavra pronto-a-vestir estava longe do léxico. "A arte não tem valores novos. Está a desapare­cer". A casa que o pai fundou, nos idos de 1908, na Rua da Rainha, vai fechar, pois claro, que já muito aguentou o mestre.

In JN
20/05/2008


terça-feira, 20 de maio de 2008

XIX Encontro Nacional
dos Mestres Alfaiates




Belmonte

25 de Maio de 2008





domingo, 24 de fevereiro de 2008

Corte à medida


Manuel Queirogas, artista do corte e da costura é um dos poucos alfaiates da cidade do Porto, que vai sobrevivendo ao crescimento desenfreado das confecções e dos fatos prontos na hora.
Começou cedo a aprender a arte da alfaiataria. Aos 12 anos já trabalhava com a agulha e a fita métrica e dava os primeiros passos na con­fecção por medida, pelas mãos de alguns mestres. Ainda adolescente veio para a cidade do Porto trabaIhar e há 10 anos começava a trabalhar por conta própria e a ganhar a confiança dos seus clientes. "Mui­tos deles senhores ilustres da cida­de, que ao longo dos anos foram sendo vestidos pelas minhas mãos. Cada um com os seus gostos e com as suas medidas", explica.
Em tempos feudais eram alia­dos de extrema importância de gran­des senhores e de grandes famílias. Elementos indispensáveis na con­fecção das indumentárias, os alfaiates eram tidos em grande conside­ração pela sociedade. A grande ha­bilidade que lhes era exigida fazia deles mestres rigorosos e profissio­nais de alto gabarito. Nos últimos anos os alfaiates foram, no entanto, perdendo força, apesar de mante­rem a qualidade dos seus serviços intacta.
Manuel Queirogas lamenta o enfraquecimento do sector, o desa­parecimento de muitos dos seus co­legas de profissão e a multiplicação das lojas pronto-a-vestir, que con­tribuíram para esse enfraquecimen­to. As encomendas vão surgindo, agora, a conta gotas diz, "com o nú­mero a aumentar apenas em alguns meses. Os meses de Outubro, No­vembro e Dezembro são, sem dú­vida, os mais fortes", explica Ma­nuel Queirogas, "no resto do ano as encomendas vão surgindo aos poucos. Aumentam apenas nas mudanças de estações", explica.
"Há 20 anos quem queria um bom fato tinha que procurar o al­faiate", lembra o artista, "hoje a rea­lidade é diferente. As grandes con­fecções tomaram conta do merca­do. É a elas que a maioria dos ho­mens recorre para adquirir um fato. Uma solução que embora se apresente facilitada pode não ser a melhor", alerta.
No Queirogas Alfaiate encon­trará tecidos e cortes das melhores marcas, às mais acessíveis, "com a garantia de que sairá com um fato feito à medida das necessidades de cada um. Aqui ao contrário das lo­jas o cliente não paga a marca". Pa­gam o trabalho de um artista, que faz da tesoura o seu aliado.
Manuel Queirogas lamenta que os aprendizes tenham desapare­cido e que a profissão corra o risco de desaparecer, por falta de sucessores. Os mais velhos vão tentando manter viva a arte e vestindo aqueles que se mantêm fiéis ao corte.

In Primeiro de Janeiro




A arte de bem vestir

Fernando Gonçalves Alfaiate, a experiência na hora do corte


Senhores do corte e da cos­tura foram durante muitos anos o auxílio indispensável na arte de bem vestir as pessoas, que sem eles não podiam passar.
No entanto, com o desen­volvimento desenfreado do pronto-a-vestir, em todo o mundo, nos últimos anos o papel do alfaiate foi perdendo força progressivamente e o número de enco­mendas foi diminuindo. Hoje há, no entanto, quem lamente o de­saparecimento progressivo desta tão bela arte. Os «artistas anti­gos» vão trabalhando a conta gotas, com a certeza de que já não encontram aprendizes a quem ensinar o ofício. Enquanto exis­tirem, no entanto, os alfaiates vão tentando manter viva esta arte antiga e procurando estar no mercado através da diferença e da qualidade.
Com dez anos apenas, Fernando Gonçalves começava a to­mar gosto pela arte do corte e da costura, acompanhava a mãe, costureira, "de mão cheia", diz, quando ia para o trabalho e não mais deixou de querer aprender a arte. Trabalhou em outras acti­vidades, mas cedo percebeu que o seu futuro passava pela alfaiataria.
Em 1971 tirou o Diploma de Contra Mestre, na Academia de Corte para Alfaiate, "por cor­respondência", lembra com sau­dade. Estabeleceu-se, bem no centro da cidade do Porto, onde permanece até hoje.
Com muitos anos de expe­riência no sector vai mantendo a sua actividade viva, resistindo ao sabor dos tempos e ao desapare­cimento dos colegas de profissão e de clientes antigos e fies. Co­nhece como ninguém a arte do corte por medida. Vestiu ao longo da vida, "muitos senhores. Alguns de extrema elegância, que procuravam sempre bons fatos, alguns para cerimónias es­peciais", lembra. "Há 30 anos quem queria um fato tinha mes­mo que recorrer ao alfaiate e o conceito de bem vestir era ou­tro". Hoje a realidade é diferente. Os mercados abriram-se e fo­ram «invadidos» pela prolifera­ção das confecções, que contribuíram de forma significativa para retirar mercado aos artistas do corte. As encomendas foram diminuindo e o hábito de recor­rer ao alfaiate foi desaparecendo com o surgimento de novos há­bitos de vestuário e de novas ge­rações. Fernando Gonçalves diz que para isso também contribuiu "o desaparecimento do fato dos guarda-roupas dos portugueses. A juventude já não dá valor ao fato bem confeccionado", la­menta, "o dinheiro nos bolsos também vai escasseando e o fato pronto acaba por se revelar a so­lução mais acessível".
De uma marca boa ou má, Fernando Gonçalves consegue, no entanto, distinguir na perfei­ção e só de olhar, o fato que sai do pronto-a-vestir, e o que é con­feccionado pelas mãos de um ar­tista. "Os acabamentos e os cor­tes são completamente diferen­tes", diz. Uma manga mais comprida, um repuxe nas ombreiras, uma costura mal feita são porme­nores que não escapam aos olhos deste especialista e "que fazem a diferença na arte de bem vestir um fato", realça. "Um fato à medida é sempre um fato à me­dida. Feito para o nosso corpo e adaptado às nossas característi­cas físicas". Apesar das dificuldades do negócio e da diminuição das en­comendas, Fernando Gonçalves vai trabalhando, .todos os dias, com a mesma força e a mesma destreza de outros tempos. Im­prime o mesmo rigor e a mesma qualidade no momento do corte e da costura. Acompanha de per­to as tendências da moda inter­nacional e tem para oferecer aos seus clientes os melhores tecidos, das melhores marcas. Inglesas, italianas e algumas portuguesas, com uma variedade de oferta alargada, na procura de satisfa­zer sempre todo o tipo de clien­te. Do mais modesto ao mais exi­gente.

In Primeiro de Janeiro

Mãos de Ouro

Alexandre Oliveira Ferreira é mestre na arte de bem coser e um dos melhores e mais antigos alfaiates do Porto, e, quem sabe, de Portugal. Detentor de uma sabedoria incalculável numa arte que, infelizmente, hoje, se encontra em extinção. Este é um exemplo de 50 anos de sucesso e amor a um ofício de longa data.

O alfaiate é responsável pela confecção da indumentária, é mestre especializado e tido em grande consideração. Possuidor de grande habilidade em talhar, cortar e exe­cutar qualquer peça que lhe seja re­quisitada, é-lhe ainda exigido saber a quantidade de pano necessário para a confecção de cada peça. Pelas mãos do nosso entrevis­tado já passaram um número sem conta de clientes. Em entrevista ao jornal «O Primeiro de Janeiro», Alexandre Oliveira Ferreira conta a história dos anos de actividade no seu oficio. "Comecei a trabalhar como alfaiate aos 13 anos de ida­de, na mesma alfaiataria de que sou proprietário, mas, como emprega­do. Nessa altura era meu patrão Américo Pacheco, que infelizmen­te morreu tinha eu 23 anos. Foi então que tomei a iniciativa de fi­car com o estabelecimento e conti­nuar o ofício", explica o nosso en­trevistado. O «Alexandre alfaiate», já exis­te há 50 anos, sendo essa uma das razões de hoje ser uma casa com nome na cidade do Porto. O nosso interlocutor, durante os anos de actividade, vestiu pessoas de grande importância na Invic­ta. Os alfaiates de renome eram fre­quentados pela classe média alta da sociedade portuense, talvez tam­bém, devido ao facto dos preços pra­ticados para um fato, que impossibi­litavam o acesso a uma classe mais baixa. "A qualidade é algo que não tem preço. Basta o facto de o fato ser feito especificamente para essa pessoa, que lhe vai "cair" de uma forma perfeita, podendo, até, atra­vés das mãos do alfaiate disfarçar alguma incorrecção na postura do cliente", declara Alexandre Olivei­ra Ferreira.
Hoje o estabelecimento já não é tão procurado como há dois anos atrás, esta é uma prática que está cada vez mais a cair em desuso, ou seja, ir ao alfaiate mandar fazer um fato. As razões são duas: uma por­que as pessoas não têm tempo e pre­ferem ir a um pronto-a-vestir, onde podem experimentar e levar logo para casa, a segunda razão pode ser atribuída aos preços, porque a soci­edade portuguesa está a ser afectada por uma crise económica, cor­tando naquilo que atribuem ser mais supérfluo. Como nota de curiosida­de, refira-se, também, que a faixa etária mais jovem nunca foi grande adepta desta arte, preferiram, sem­pre, as práticas calças de ganga "Não digo que perdi os meus clientes, isso não é verdade, apenas noto uma redução no número de fatos que me encomendam por ano, e, noto também que nos dias que cor­rem sou mais requisitado por cli­entes que têm dificuldades em en­contrar no pronto-a-vestir, fatos com os seus números, ou então, também sou procurado por pesso­as que procuram algo de diferen­te, que precisam de uma pessoa como eu para lhes fazer um fato", explica o nosso entrevistado.
O estabelecimento do nosso entrevistado é composto pelo atelier e por uma boutique no rés-do-chão, onde expõe as suas obras de arte e, onde também expõe todo o tipo de acessórios, que possam acompanhar um fato e, ainda as fazendas com que são confeccionados os fatos. O cliente que entre na loja de Alexandre Oliveira Ferreira, encon­tra à sua disposição um catálogo onde pode escolher o feitio que pre­tende e, no mesmo sítio escolher as fazendas que são todas de grande qualidade, pois esse é um requisito imprescindível para a confecção de um bom fato. É, também, impor­tante referir que todos os fatos aqui confeccionados são exclusivos, nun­ca são feitos dois fatos iguais, por outro lado, é de referir que não se consegue, no comércio do pronto a vestir, encontrar fazendas iguais às que o Alexandre... utiliza. "Na mi­nha loja só utilizo fazendas da me­lhor qualidade, só trabalho com fa­zendas inglesas e italianas", comen­ta Alexandre Oliveira Ferreira. Agora com 70 anos, o nosso entrevistado enfrenta as consequên­cias da industrialização, que lhe fez descer as vendas, porque a popula­ção portuguesa prefere ir para o shopping fazer as suas compras, esquecendo-se do comércio tradicional. Esta é também a sua principal concorrente, pelas razões já referi­das atrás. Esta é uma profissão em ex­tinção, porque ninguém a quis se­guir, "para se ser um bom alfaiate são necessários mais anos do aque­les necessários para tirar um curso superior numa faculdade, por essa razão eu lhe atribuo o nome de cur­so superior.Pois para se conseguir executar uma fato na perfeição são necessários seis anos de muito trei­no e dedicação. Esta é uma profis­são como os antigos sapateiros que faziam sapatos por medida e que hoje estão em extinção, como nós", lamenta o nosso entrevistado.
Alexandre Oliveira Ferreira la­menta o facto de não ter consegui­do incutir aos seus filhos o gosto por esta profissão, nem ter conseguido ensinar nenhuma pessoa, que agora podia continuar e preservar a sua arte e os seus segredos.
Para concluir o nosso interlo­cutor deixa uma mensagem aos seus clientes e futuros clientes, "queria desejar a todos os meus clientes um Feliz Natal e boas en­tradas para o ano novo e que tudo lhes corra pelo melhor. São estes os meus votos, e claro, que não deixem de aparecer na minha loja".

In Primeiro de Janeiro

O Grupo Scabal

A Scabal é geralmente vista como líder mundial no que respeita a tecidos de prestígio para homem e está representada em 65 países. Além de fornecer os seus ercelentes tecidos aos principais alfaiates e estilistas mundiais, a Scabal também propõe uma colecção de acessórios e pronto-a-vestir.
Fundada em 1938 na cidade de Bruxelas, Bélgica, a Scabal está envolvida no design, fabricação e venda de tecidos, pronto-a-vestir (Ready-to-Wear) e roupa por medida (Made-to-Measure), permitindo aos seus clientes aperfeiçoar a sua própria arte de expressão, através da forma de vestir. Todos os tecidos são produzidos exclusivamente no Reino Unido ou Itália e mencionam o nome Scabal na ourela como prova de autenticidade e qualidade. A capacidade de produção Scabal está dividida entre uma fábrica de tecidos em Yorkshire, Reino Unido, e uma confecção de vestuário em Saarbrúcken, Alemanha.
Os tecidos Scabal, sin
ónimo de prestígio e requinte, são utilizados pelos melhores alfaiates e estilistas mundiais, e usados por personalidades distintas e famosas incluindo políticos, empresários, reis, desportistas e actores como Robert De Niro, Jack Nicholson, Tom Cruise, Michael Jordan,....
Nos Estados Unidos, uma grande parte das vendas s
ão direccionadas para os estúdios de filmagens em Hollywood, os tecidos Scabal têm sido usados em muitos filmes da actualidade incluindo "O Alfaiate do Panamá" (The Tailor of Panamá), Titanic", "Casino", "007 - Golden Eye", "MIB - Homens de Negro" (Man In Black), "Os Intocáveis" (77?e Intouchables), "Apoio 13", "Batman Forevef e "Batman Returns", "Dracula", "A Família Adams" (The Adams Family), "A Firma" (The Firm). A Scabal também forneceu tecido para os filmes "Wall Streef, "A Máfia" (The Mob) e toda a saga de "O Padrinho" (Godfather).
O Ready-to-Wear Scabal est
á disponível por toda a Europa e é complementado pelo sistema Made-to-Measure. Este sistema permite que um fato seja personalizado de acordo com as especificações e desejos do cliente, dando-lhe a oportunidade de escolher o seu tecido Scabal perante uma vasta colecção, nunca inferior a 5000 artigos diferentes (desde o Super 100'S ao Super 250'S, lã, caxemira, seda, etc.), bem como o modelo que melhor lhe assente. Todos os fatos Made-to-Measure são disponibilizados em apenas 3 semanas. Se desejado, até o nome do cliente pode ser bordado no interior do fato.
A Scabal foi pioneira no desenvolvimento do conceito Made-to-Measure h
á 25 anos atrás e é ainda uma das empresas lideres no que respeita a fatos por medida personalizados.
A Scabal, com sede em Bruxelas, em pleno cora
ção da Europa, emprega 600 pessoas. É uma empresa privada com presença na maioria dos países europeus bem como noutros grandes centros em todo o mundo. Existem lojas Scabal em Bruxelas, Londres, Milão, Paris, Atenas, Amesterdão, Genebra, Dusseldorf, Istambul, Estados Unidos, Japão, Hong Kong...
Em1996, a Scabal lan
çou uma linha de acessórios, uma exclusiva colecção de produtos que inclui camisas, gravatas, malhas e cintos, para que os clientes Scabal se possam vestir como um Gentleman da cabeça aos pés. Os acessórios são fabricados em Itália pelos melhores artífices e, tal como os tecidos, são produzidos com recurso a materiais de elevada qualidade. A Scabal tornou-se uma marca reconhecida internacionalmente, por representar o melhor vestuário para homem, seja pelo tecido para um fato por medida, pelo Ready-to-Wear ou pelos acessórios.

João Vaz

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Scabal


No Tortosendo, Covilhã, uma empresa importadora de tecidos para alfaiataria apostou nas mais luxuosas fibras e na qualidade dos seus profissionais para se lançar no mercado. O resultado é o sucesso num mercado nacional onde há o interesse por produtos de qualida­de e de personalização. Com uma filosofia centrada na qualidade, inovação e criati­vidade e um serviço personaliza­do, a J. Vaz & Irmão, Lda tem se destacado no mercado português.
Esta empresa localizada em Tortosendo, Covilhã, representa a marca internacional Scabal, funda­da em Bruxelas, em 1938. Inicial­mente a Scabal era uma empresa que fabricava vestuário destinado aos operários; porém, ao longo dos tempos, esta pequena empresa transformou-se na "empresa-mãe" de várias fábricas de alta qualida­de, com os desenhadores mais prestigiados e com um negócio têx­til alargado a todo o Mundo. De início a empresa tinha seis trabalhadores. Neste momento, a Scabal emprega 600 funcionários em todo o Mundo. A evolução da multinacional passou pela introdução do prêt-a-porter, permitindo que os clientes expressassem a sua personalidade através do que vestiam. Esta cria­ção do vestuário feito à medida há 25 anos atrás, ainda hoje se reper­cute no sucesso da empresa nesta área. Constantemente empenhada na procura das mais luxuosas fi­bras, a Scabal através dos seus re presentantes, procura prestar o mesmo nível de qualidade de aten­dimento. A J. Vaz & Irmão, Lda é a presença deste requinte em Por­tugal, representante do tecido da multinacional e responsável pela distribuição deste tecido no País.
Corria o ano de 1992, quan­do foi realizada a fundação da em­presa J. Vaz & Irmão, Lda. Esta ocorreu após o primeiro contacto do representante da multinacional Scabal com Jorge Vaz. A empresa iniciou a distribuição de tecidos a metro para alfaiates. Pouco a pou­co a empresa foi crescendo e alar­gando o seu público-alvo. Neste momento, as zonas do Grande Porto, Lisboa e Coimbra represen­tam os pontos de venda mais im­portantes desta empresa. Quanto aos seus principais clientes, estes são alfaiates, lojas de pronto-a-vestir e particulares. Os tecidos que são apresentados pela J. Vaz & Ir­mão, Lda são constituídos por caxemira e também por cem cento lã. Jorge Vaz mostra optimismo quanto ao mercado, porque "mui­tas pessoas procuram tecidos de boa qualidade". Contudo, há tam­bém uma perspectiva pessimista da parte de Jorge Vaz, visto que ao número de clientes tende cada vez mais a diminuir, o que nos obriga a inovar e procurar alternativas*.

In "O Primeiro de Janeiro"

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Mãos de Tesoura

OS HOMENS "DE BERÇO" CONTINUAM A ENCOMENDAR OS SEUS FATOS POR MEDIDA. DAS GRANDES FAMÍLIAS TRADICIONAIS, A POLÍTICOS E EMPRESÁRIOS, A TRADIÇÃO É A PALAVRA DE ORDEM. EM NOME DA ELEGÂNCIA. UMA VIAGEM PELOS "ATELIERS" DE LISBOA E PORTO QUE INSISTEM EM DESENHAR OS CORPOS.





O pudor aristocrático de Augusto Saldanha impede-o de falar de dinheiro.
" Os
botões de um bom fato por medida podem ser mais caros do que um mau fato"

"O gabinete de provas é um confessionário." Augusto Saldanha, o autor da frase, é alfaiate esta­belecido no Porto, na Rua de Trindade Coelho, perto da Estação de S. Bento. "As pessoas contam--me muitos problemas da vida, aqui." Augusto Saldanha, nascido em Freixo de Espada à Cinta, 54 anos, alfaiate desde os 12, é um homem das Arábias. Pequeno, agitado, repete vezes sem conta: "Orgulho-me do meu trabalho." Sente orgulho dos fatos feitos por medida, em que as golas dos casacos não dependem de cortes--padrão, os botões das mangas têm casas reais e não fingidas, os pespontos evitam aquele ar industrial do pronto-a-vestir, as riscas ou os quadrados da fazenda acertam nos ombros e nos bolsos. Orgulha-se também de ver os clientes pas­sarem na rua bem vestidos. Orgulha-se ainda dos nomes sonantes para quem corta os fatos: Pessanhas, Pinheiros Torres, famílias consideradas do Porto: "Encomendam pouco, mas bom. São gente de berço e tratam-me bem." Há três anos conquistou um novo cliente, o ex--ministro da Defesa e ex-presidente do CDS-PP: Paulo Portas. Nem precisa de afirmar o orgulho que sente nesta aquisição; uma fotografia do político e do alfaiate, ambos sorridentes, tirada no Forte de S. Julião da Barra, reina numa estante da sala de provas, imagem que ele não deixou repro­duzir. "Trabalho com ele e com pessoas amigas dele." O que mudou na imagem de Portas nestes últimos três anos ele recusa dizê-lo, com humil­dade formal: "Isso são vocês, jornalistas, que devem notar." Mas adianta que nunca mais se viu o antigo ministro com casacos de três botões (limitam-se a dois) ou de ombros largos. Em contrapartida, cada manga passou a andar com a última casa desabotoada para transmitir um ar casual. E os forros podem ir do azul-psicadélico ao vermelho-comunista: "Chamei-lhe a atenção, mas o dr. Portas respondeu-me que o sangue de Cristo também era vermelho..."




O ambiente do Rosa & Teixeira é altamente fotogénico, misturando o requinte da faia, da brecha da Arrábida, com o luxo dos tecidos naturais

A empresa de alfaiataria Rosa & Teixeira trans­formou-se num ícone nacional. As instalações principais estão hoje na Avenida da Liberdade, em Lisboa, e há também uma loja no Porto. Para roupa por medida, os clientes devem deslocar-se, porém, à capital. A história desta casa é já cen­tenária. No século XIX, Manuel Amieiro aper­feiçoa a sua arte na parisiense Rue Royale - então centro mundial da moda - e regressa a Lisboa. O rei D. Carlos e os infantes foram seus clientes, tal como o conde de Paris, pretendente à coroa de França. O seu discípulo Francisco Rosa associa-se ao genro António Teixeira. Estava encontrado o nome da firma. Agora, a empresa - com loja de porta aberta para a rua onde se vende também pronto-a-vestir de luxo - pertence a José João de Castro, antigo gerente do Pestana & Brito, que ficou dono absoluto depois da saída voluntária da família do sócio Miguel Ribeiro. De remodelação em remodelação - 1981, 1985, 1996 -, a casa foi afinando o seu cenário de alta costura: tornou as instalações mais clássicas onde era necessário e preservou o que estava bem, como o fantástico gabinete de provas. O 'atelier', composto por 15 costureiras, 20 ofi­ciais e um mestre, é chefiado por Eugênio Fernandes Gomes, 61 anos, homem simpático e tímido. Nascido na freguesia de Ribeira Dio, concelho de Oliveira de Frades, foi chamado para a profissão por um tio que vivia no Seixal. Nunca mais parou. Dono de oficina própria, levou para o Rosa & Teixeira as suas empregadas. Entende-se: Gomes é sensível e fica transtornado quando se lhe pergunta porque deixou a sua oficina para trabalhar por conta de outrem: "Ainda nem perce­bi bem. Não gosto de falar disso' Comove-se. Rosa & Teixeira dispõe ainda de outra oficina, com sete pessoas, para acertos em fatos de pronto--a-vestir. O ambiente é altamente fotogénico, mis­turando o requinte da faia, da brecha da Arrábida, do latão, com o luxo dos tecidos naturais: seda pura lã, linho. Na retaguarda, estruturas do ar condicionado que combatem o calor do pesadís­simo ferro-de-engomar; condutas que libertam o ar do pó das fazendas; rolinhos contendo os moldes e as medidas de cada freguês, com os nomes destes colados dão ao canto de uma sala um vago ar japonês. "Quando engordam ou ema­grecem, chamamo-los cá para rectificar medidas", explica Eugênio Gomes. Nem toda a gente se permite um fato por medida no Rosa & Teixeira. Os preços, pendurados nos cortes de fazenda e nas peças de pronto-a-vestir da loja, são vertiginosos. "Os melhores clientes têm bom gosto e podem usufruir desse bom gosto. Trazem os filhos quando eles fazem o primeiro fato. Promovem a cultura de bem--vestir", comenta Maria do Carmo, relações públicas e há 23 anos na casa. No Porto, Augusto Saldanha navega nas mesmas águas: "Um bom fato por medida pode ficar mais barato do que um bom fato de confecção industrial. Os botões de um bom fato por medida podem ser mais caros do que um mau fato de confecção inteiro/' Uma espécie de pudor aristocrático impede que se fale de dinheiro.



A Labrador tem um clientela selecta de administradores de bancos, advogados, economistas e políticos. "Também jornalistas", acrescenta José Pinheiro

Durante anos, o pronto-a-vestir roeu o mercado aos alfaiates tradicionais. Muitos abandonaram, reformando-se, ou foram contratados por 'ateliers' industriais. Mas os que resistiram parecem afogados em trabalho. Saldanha - com uma operária fixa e duas colaboradoras em casa - afirma que está melhor: trabalha para o teatro; corta togas para advogados e becas para juizes; responde a encomendas de estilistas; desenha casacas para os bailes de debutantes do Porto. No Rosa & Teixeira, ufanam-se de grande clientela, tanto nacional como de estrangeiros que vivem em Portugal. Mas toda a gente lamenta a crise do sector, provocada sobretudo pela falta de profissionais. Não há pessoal, queixava-se já no século XIX o conde de Gouvarinho, personagem do romance 'Os Maias', Eça de Queirós. No entender dos mestres que restam, faltam aprendizes e não há porque as escolas são escassas e as que existem preparam profissionais para a indústria e não para o artesanato. "O único estabelecimento de ensino que nos pediu para trazer alunos a visitar as oficinas foi a Casa Pia", conta Maria do Carmo. A Labrador - empresa de pronto-a-vestir de quali­dade, com duas lojas em Lisboa, uma no Porto e outra em Madrid - tem oficinas para fazer acertos personalizados na roupa vendida: cortar calças, des- manchar ombros e ilhargas de casacos, refazer os pontos, abrir casas falsas de botões. José Joaquim Pinheiro é o mestre do principal 'atelier', com cinco funcionários, situado num quintal sempre florido nas traseiras da loja, na Rua Braancamp, em Lisboa. Nascido há 66 anos, em Pinhel, começou aos sete como aprendiz. Chegou à Labrador em 1997 e tem saudades de "trabalhar na medida, de levar a obra do princípio ao fim". Casa dirigida às classes médias e altas, não oferece essas alterações (gratuitas) a todos os clientes. "Só a alguns, os mais impor­tantes", sorri José Pinheiro, que propagandeia uma clientela selecta de administradores de bancos, advogados, economistas, como o professor António Borges, e políticos como Correia de Campos, ministro da Saúde. "Também jornalistas", sorri de novo: "Mário Bettencourt Resendes, Luís Delgado."





Herança - Os mestres devem estar atentos a todos os pormenores. O perfeccionismo é a sua arma. Carlos Mendes, uma espécie de sindicalista da classe, gostava que a arte perdurasse com os filhos. «Talvez seja utópico»

Regresso ao artesanato. Carlos Mendes, 56 anos, natural de Pampilhosa da Serra, é uma espécie de sindicalista dos mestres alfaiates. Lamenta a inexistência de escolas, o autodidactismo da classe, a loucura dos impostos: "Esta firma, que é minha e da minha mulher, paga impostos como se fosse uma indústria." Segundo Carlos Mendes, a alfaiataria deveria ser taxada como arte­sanato. Com uma loja na Praça da Alegria, em Lisboa, onde emprega duas costureiras, chegou a Lisboa como aprendiz, em 1965. Oriundo de uma família de alfaiates - pai e irmão mais velho -, o des­tino estava traçado: "Acabada a instrução primária, não havia outro futuro." Estabeleceu-se por conta própria em 1971. Lembra-se de quando aprendizes e oficiais eram muitíssimo mal remunerados, o que afastou gente da profissão, por isso os impostos deveriam baixar para que ele lhes pudesse pagar melhor. "Talvez seja utópico." Utopia que o leva a participar como presidente da assembleia geral da Comissão de Melhoramentos da sua aldeia natal, Lomba do Barco, junto ao Zêzere: "Sou regionalista. O interior do País está a ficar deserto." Como deserta está a profissão. Todos estes mestres alfaiates - nascidos na província, em famílias pobres - têm filhos. Nenhum quis seguir a arte dos pais.

ns

Texto -Torcato Sepúlveda

Fotos - Dora Nogueira



domingo, 27 de janeiro de 2008

Homenagem


Alfaiate à moda antiga resiste no Porto

Vitorino Sampaio Lei­te, alfaiate de profis­são, enternece-nos quando fala da seu pequeno atelier, como se fosse uma casa de bonecas onde perma­necesse desde a adolescência, por gosto de confeccionar as vestes dos senhores do seu imaginário. Também disfarça um já pouco comum amor à arte, preferindo perder a ga­nhar se o cliente questiona o seu trabalho, que por vezes habilmente molda a um cor­po já sem medidas ou sem modelos fabricados nas redes comerciais.

Entregue ao mister des­de 1958, e há 33 anos instalado na Avenida Bra­sil, à Foz do Douro, o artífice é simplesmente des­conhecido de parte das ge­rações mais recentes, que ignoram haver ainda fatos de homem que se fazem por medida, que se provam duas e três vezes para as­sentar bem as costuras ou para combater a teimosia de uma ruga persistente.

«Gosto da profissão mas poucas vezes me agra­da o que faço», exterioriza, deixando a impressão da exigência com que constrói as suas peças, desde as indumentárias normais até à chamada «obra de cinta» (smoking ou casaca), acolitado por dois ou três colaboradores que resistiram a um trabalho praticamente em extinção. Apesar de tudo, obra não lhe falta, embora a procura venha apenas do pequeno estrato que fez frente ao pronto-a-vestir ou que não se imagina com outro traje senão um clássico «blaser» ou um paletó confeccionado em puro algodão do Egipto. O custo não é exagerado se avaliar­mos o preço que hoje atinge qualquer insignificância «hand made», ou os fatos italianos «prêt-à-porter» que proliferam nas lojas da especialidade. Já não haverá muitas alfaiatarias do género no Porto a quem o cliente possa confiar um bom corte de fato. As roupas de marca quase que lançaram este pequeno grupo de artífices num beco sem saída, apesar de o rigor e qualidade que teimam oferecer permita manter ainda um lote de perduráveis apreciadores.

«Os clientes é que fazem a casa»

«Os clientes é que fazem a casa, embora as mãos também tenham o seu va­lor», constata Vitorino Lei­te, segurando no braço direito um casaco alinha­vado sem mangas. O traba­lho, como é fácil perceber, tem muito que se lhe diga, sendo sujeito a vários tes­tes: na primeira prova, fa­zenda e forros são molda­dos ao corpo do cliente, sendo posteriormente testa­dos de novo, mas já com as frentes elaboradas. Nor­malmente recorre-se a uma terceira prova, com manga e gola alinhavada, antes de se concluir a peça, que finalmente é rematada e engomada. Antes a fazenda é sujeita ao chamado «ressoo», sendo só depois cortada e preparada para as provas. Uma tarefa delicada, mas que é acompanhada de um saudável convívio com clientes, que o artista aproveita para pôr a conversa em dia e contar as últimas novidades.

O alfaiate tem três cola­boradores - profissionais que o acompanham há dé­cadas, sempre fiéis, «uma equipa maravilhosa», como o próprio a define, reconhe­cendo que dificilmente en­contraria gente nova para trabalhar à sua maneira. «São profissionais excelen­tes, e merecem tudo porque me acompanham há muitos anos».

Vitorino Leite não pare­ce ser daqueles profissionais que leva os problemas para casa, que dorme com eles em cima do travesseiro, mas preocupa-o atrasar a obra e o cliente apressado que lhe deixa à porta a mensagem que todos bem conhecemos: «Preciso deste fato para sexta-feira, sem falta».

Da sua clientela diz ser «gente de princípios que gosta de vestir bem» (o artista aprecia enaltecer as pessoas que o procuram, que considera «a razão de ser da sua alfaiataria»), possuindo também um rol de «amigos da casa» que com ele se aconselharam e depois acabaram por gostar do seu trabalho. O alfaiate orgulha-se de ter em cartei­ra «gente de grande exigên­cia», constando do seu fi­cheiro desde comandantes de navio até conceituados ídolos da canção, como o saudoso Tony de Matos.

Especialista em corte clássico, Vitorino Leite mol­da-se ao gosto de qualquer pessoa, mostrando-se capaz de executar desde o modelo mais ligeiro até aos fatos de linha italiana exclusivos das afamadas catedrais da mo­da. «Executo qualquer tra­balho, clássico ou moderno, só que o cliente tem que me dizer bem o que quer», explica.

Alfaiataria ocupa a casa onde morreu António Nobre

A alfaiataria funciona como qualquer casa vulgar do ramo. Aliás, o cliente pode comprar ali os forros, tecido e até botões, tudo das melhores origens. Em maté­ria de fazendas o artista prefere não arriscar, pos­suindo padrões para todos os gostos, desde as peças nacionais até aos consagra­dos fios italianos e ingleses.

No Inverno, como é natural, o trabalho aperta e o tempo escasseia à medi­da que o Natal se aproxima. A alfaiataria confecciona entre dois a três fatos de homem por semana, poden­do até satisfazer mais clien­tes que lhe encomendam peças soltas. «Os alfaiates têm fama de demorar muito graceja, embora nos garan­ta que nunca deixou ficar um cliente desprevenido. «Fui sempre pontualíssimo, sempre muito direitinho. Nesse aspecto não tenho histórias para contar».

De resto, Vitorino Leite parece nada ter a recear. E é vê-lo, pouco depois do meio-dia, conversador, a pisar sossegadamente o pas­seio da Avenida Brasil, em direcção a casa. A alfaiata­ria ocupa o rés-do-chão do edifício onde morreu Antó­nio Nobre, uma antiga casa de praia de que Vitorino se orgulha e que parece não querer abandonar por nada deste mundo, apesar das propostas que já lhe chega­ram às mãos. No entanto, já com mais de sessenta anos de idade, o alfaiate não deixará continuadores no ofício.

Mas o artista, para já, não pensa nisso, preferindo recordar os tempos em que se decidiu pela profissão, ensaiando os primeiros gol­pes de agulha e os precoces alinhavos, e lembrando o rigor que sempre dedicou ao seu mister: «No começo nunca me agradou o meu trabalho, queria aprender sem deslizes; quando corria mal, sem dar a entender a alguém, afastava-me e cho­rava».

Manuel Morato (texto)

Angela Velhote (foto)